quinta-feira, 5 de março de 2009

Crítica de Buñuel: Subida al Cielo

Em 1951, Luis Buñuel estava em seu longo exílio no México, onde dirigiu dezenas de filmes, todos eles com uma pitada de sua verve surrealista mas, em linhas gerais, bem calcados no realismo. Subida al Cielo (ou, em inglês, Mexican Bus Ride) é um filme curto, de 75 minutos, dessa sua "fase mexicana" .

A estória começa em uma cidadezinha perdida no litoral mexicano, tão pequena que nem igreja tem. Para se casar, basta que o casal tenha a benção dos pais da noiva e passem uma noite em uma ilha próxima, mais nada. Um jovem casal acaba de se casar mas, no caminho da ilha, são surpreendidos pelo irmão do noivo, em um barco, dizendo que a mãe deles está morrendo. Com a lua-de-mel interrompida, o casal parte para ver a mãe do noivo, uma aparentemente rica dona de propriedades (apesar de a aparência do lugar ser terrível). Lá chegando, a mãe pede ao seu filho que acabou de casar - Olivério - que chame um advogado de uma cidade distante para fazer o testamento dela, já que ela quer ter certeza que seu neto Chuchito (ainda criança, filho da irmã de Olivério, que morreu no parto) será o proprietário de sua casa, de forma que ele possa ter dinheiro suficiente para ter uma boa educação. Sem alternativas, e vendo seus dois outros irmãos já sedentos pela herança, Oliverio parte na tal "Mexican bus ride" do título em inglês.

São dois dias de viagem em que Oliverio fica desesperado para chegar na cidade onde mora o advogado e é nessa jornada que o filme foca. A cada segundo, começando com um pneu furado, os passageiros do ônibus, encontram problemas. O filme trabalha muito bem a angústia do rapaz e as figuras que povoam o ônibus: o motorista que pára para dormir sem mais nem menos e obriga todos os passageiros a comemorar o aniversário de sua mãe querida; o político que só pensa em angariar votos e correr atrás de um rabo de saia; a moça (belíssima, aliás) que é apaixonada por Olivério e não descansa enquanto não o abate; o pai durango levando sua filha para passear na cidade grande; donos de bodes; um sofisticado vendedor de galinhas e uma família indo enterrar a filha morta (com o caixão, claro). 

Em suma, a viagem é, na verdade, um microcosmo do México da época (e arrisco dizer, de hoje também) e nosso amigo Olivério, tem que fazer de tudo para alcançar o advogado e voltar antes que sua mãe venha a falecer e seus irmãos acabem com o patrimônio de seu sobrinho. 

É muito interessante (e emblemático, eu diria, conforme explicarei abaixo) o uso de miniaturas que Buñuel faz. Na cena em que o ônibus, dirigido apenas por Oliverio e Raquel (a tal da moça que só pensa no rapaz) está subindo o morro chamado Subida al Cielo, fica claro queo se trata de um carrinho "Matchbox" em cenário altamente artificial. A transição é bem na "careta de pau" mesmo mas, de toda maneira, bem eficiente. As situações, como um todo, são muito cômicas e caricatas e Buñuel, claro, não deixa de mostrar um pouquinho a que veio em uma cena em que Olivério sonha com Raquel em seus braços. O filme basicamente se passa dentro do ônibus e cumpre sua proposta de mostrar um pouquinho do México.

O ator que fez o papel de Olivério (Esteban Marquez), para conseguir o papel, mentiu sobre sua experiência com atuação. Lilia Prado faz Raquel (já disse que é belíssima?) e ela foi uma das grandes atrizes mexicanas, continuando ativa até seu último filme em 1991 (veio a falecer somente em 2006). 

Essa produção parece ter sido uma das mais atribuladas de Buñuel, com problemas com greves, sets e tudo mais. O fato de Buñuel ter usado um truque ótico e construído um cenário em miniatura para seu ônibus de brinquedo mostra claros problemas de orçamento. 

Os problemas que o diretor teve são aparentes no filme, pelos seus cortes abruptos e cenas muito pobres em termos de decoração. Fica até difícil entender se Buñuel efetivamente queria o final que assisti, já que o filme acaba de forma muito abrupta, talvez sem resolução satisfatória da trama. 

Mas, trata-se de um Buñuel. O cara é um gênio. Não sou que me atreverei a dar nota. Limitar-me-ei a dizer que é um dos trabalhos mais, digamos, "modestos" do mestre.

Ah, vale só um último comentário: o poster do filme (aí acima) é de uma dramaticidade cômica pois pouco tem a ver com o filme. Fico imaginando que Buñuel não deve ter gostado nada dessa jogada barata de marketing por parte dos produtores. Mas que é divertido, isso é.

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