sábado, 9 de janeiro de 2010

Crítica de filme: Sherlock Holmes



Eu gosto da atuação de Robert Downey Jr. desde que vi Less Than Zero há muito, muito tempo (1987!). Ele teve altos e baixos em sua vida, sendo que os baixos foram extremamente baixos, mais ou menos na linha de seu personagem Julian no filme que mencionei.

De tempos para cá, porém, o ator foi se encaixando em projetos excelentes como Kiss Kiss Bang Bang, A Scanner Darkly, Zodiac e outros. Mas a consagração veio mesmo com seu papel de Tony Stark em Iron Man. Era um filme de um personagem mais ou menos desconhecido da Marvel - pelo menos para o público em geral - mas que ele soube encarnar perfeitamente, agradando a fãs dos quadrinhos e também a quem nunca nem tinha ouvido falar no Homem de Ferro. A frase final do filme - "Eu sou o Homem de Ferro!" - não podia ser mais perfeita para esse grande ator.

Agora, Robert Downey Jr. pode se gabar de ser um dos poucos que, simultaneamente, tem na mão duas franquias de peso. Assim como ele é o Homem de Ferro, ele igualmente é Sherlock Holmes, pelo menos nessa encarnação "modernosa" dirigida por Guy Ritchie.

Acho que todo mundo deve saber que Guy Ritchie é o diretor de pérolas muito divertidas tais como Lock, Stock and Two Smoking Barrels, Snatch e RocknRolla. Esses filmes, mistos de filmes de gângster e comédias, são muito divertidos e bem claramente no "estilo Guy Ritchie". Ele é inconfundível, diria até repetitivo mas, pelo menos, tem personalidade.

Sherlock Holmes, esse novo, tem a cara de Guy Ritchie. É simplesmente o que acontece quando dão muito dinheiro a esse diretor e determinam que o filme tem que ser leve, para todas as idades. Nessa sinuca de bico, Guy Ritchie fez o que pôde e saiu para dirigir um Sherlock Holmes sem ser o Sherlock Holmes que conhecemos de longa data.

O Holmes que conhecemos é aquele detetive sisudo, arrogante, fumando um cachimbo sinuoso, vestindo um sobretudo quadriculado sobre o ombro e um chapéu da mesma cor e tecido que o sobretudo. Além disso, ele é aquele cara que volta e meia diz "Elementar, meu caro Watson". Watson, por sua vez, é o fiel escudeiro de Holmes, um homem gordinho (ou gordo mesmo), às vezes de bigode, médico e meio atrapalhado.

O que fez Guy Ritchie? Apoiando-se em roteiro que mais se preocupa em transformar Sherlock Holmes em um Jason Bourne do século XIX (mas um Jason Bourne engraçado, espirituoso, devo deixar claro), Ritchie criou um novo personagem que apenas em algumas passagens faz lembrar o personagem clássico. Nada de sobretudo, nada de chapéu, nada de cachimbo sinuoso (só um normal). Os livros de Sir Arthur Conan Doyle não contém o Holmes clássico dos filmes assim como não contém o que agora vemos na tela. Assim, qualquer coisa vale. Mas que é estranho ver Holmes repaginado para o gosto do século XXI, ah isso é.

De toda forma, como era de se esperar, Robert Downey Jr. tirou o personagem de letra, acrescentando humanidade às qualidade inumanas de Holmes. Ritchie ajudou imprimindo seu estilo nos cortes rápidos, câmeras lentas sensacionais e flashbacks dinâmicos. É muito bacana, por exemplo, ver Holmes antecipando em sua mente os golpes de uma briga, vendo-os em câmera lenta em sua mente e, depois, "em tempo real". Só Ritchie mesmo para bolar essa.

Outra ótima jogada foi a escalação de Jude Law no papel do Dr. John Watson. Nada de um Watson gordinho e atrapalhado. Vemos um homem tão inteligente em sua especialidade quanto Holmes na dele. Além disso, vemos claramente um ex-soldado, como nos livros. A dinâmica entre os dois é perfeita, ainda que, de certa forma, eles formem uma dupla intercambiável pois, para mim, seria perfeitamente possível, em qualquer cena, trocar Robert Downey Jr. por Jude Law e vice-versa. Em determinadas cenas - e acho que isso foi algo que Ritchie fez de caso pensado - há fortes insinuações homossexuais entre os dois amigos que ficam o tempo todo no maior "bromance".

Os defeitos do filme? Bem, além de ser meio estranho ver Holmes completamente alterado (mas essa foi a intenção do filme, não sendo razoável julgá-lo por isso), há o uso exagerado de computação gráfica para fazer a Londres do final do século XIX. Em tempos de Avatar, meu patamar de qualidade de CGI mudou e Holmes está bem aquém do padrão que hoje se exige. Não é ruim mas é que a cidade está meticulosamente suja, cuidadosamente desarrumada, detalhadamente enfumaçada. Além disso, dá para ver que Guy Ritchie trabalhou sob as ordens expressas da Warner ao criar algo feito especialmente para virar uma franquia, até mesmo com um final descaradamente forçando uma continuação. Só faltou um "to be continued" ao final do filme. Aliás, sobre esse ponto, a trama paralela envolvendo um ex-caso de Holmes, Irene Adler (Rachel McAdams) para forçar o tal final aberto é artificial e desnecessária, meio desconexa em relação ao resto do filme.

Esqueci de falar sobre a estória. Holmes começa o filme terminando com a farra assassina de Lorde Blackwood (Mark Strong). Blackwood, um verdadeiro feiticeiro em pleno ritual de magia negra, vai preso mas logo depois ressucita para tocar o terror em Londres. Cabe a Holmes e a um relutante Watson (já que vai casar) tentar resolver o problema. A trama é exageradamente complicada e cheia de voltas e aí vem mais um defeito do filme: ela é explicada, tintin por tintin por Holmes, com o uso de flashbacks didáticos para um público imbecil. Nada fica para a dúvida e a falta de uma "zona cinzenta" é, sinceramente, bem irritante.

Um detalhe interessante. Ainda que o personagem Sherlock Holmes, nos livros, se depare com tramas sobrenaturais, a última adaptação cinematográfica que me lembro dele é o excelente Young Sherlock Holmes de 1985, dirigido por Barry Levinson. Lá, descobrimos como Holmes e Watson se conhecem e sua primeira investigação é exatamente sobre um mestre da magia negra que sacrifica belas damas em rituais macabros. Da mesma forma que a versão de agora, a versão de 1985 não apresenta o Professor Moriarty (o arquiinimigo de Holmes nos livros) como inimigo principal, ainda que sua "sombra" sempre esteja por lá. Coincidência?

Sherlock Holmes é um ótimo filme genérico de ação, no estilo de Guy Ritchie. Ele nos permite ver Robert Downey Jr. se divertindo em sua atuação e um vislumbre da genialidade do personagem que é Holmes (a cena em que ele examina a noiva de Watson é impagável). Mas o filme tropeça algumas vezes, não sendo mais que um bom divertimento passageiro.

Nota: 7 de 10

Um comentário:

  1. Excelente crítica. Não pensei muito a respeito da parte onde a trama é toda explicada o que realmente mata a parte da interpretação pessoal dos filmes e explicações pessoais para determinadas magias e truques usados.

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Pensem antes de escrever para escreverem algo com um mínimo de inteligência. Quando vocês escrevem idiotices, eu apenas me divirto e lembro de Mark Twain, que sabiamente disse "Devemos ser gratos aos idiotas. Sem eles, o resto de nós não seria bem sucedido."