quarta-feira, 28 de abril de 2010

Club du Film - 5.40 - Der Letzte Mann (A Última Gargalhada)

Der Letze Mann (O Último Homem, em tradução literal) foi o sétimo filme do 5º ano do Club du Film (mais sobre o Club ao final desse post). Assistimos ao filme no dia 02.03.10.

O filme foi dirigido pelo alemão F.W. Murnau, o mesmo do magistral Nosferatu, de 1922. Feito em 1924, Der Letzte Mann conta a estória de um porteiro de hotel (sem nome) encarnado pelo então famoso ator Emil Jannings. Ele tem extremo orgulho do que faz pois usa uma farda e porta um enorme e bem cuidado bigode. Seu emprego impões respeito no cortiço onde mora, sendo a razão principal para todos os seus vizinhos o tratarem com reverência. No entanto, um dia, quando está ajudando clientes do hotel com pesadas malas, o pobre porteiro, já com certa idade, sente dores nas costas e para por alguns segundos para tomar um gole d'água. Isso é suficiente para o gerente do hotel vê-lo dessa maneira e substituí-lo logo no dia seguinte, colocando-o na função de faxineiro de banheiro. O mundo do orgulhoso porteiro literalmente desaba e ele acaba furtando a farda para evitar o escárnio de seus vizinhos. Obviamente que o segredo vaza e o porteiro acaba se reduzindo à uma triste imagem de um velhinho sem motivo para viver.

A estória é simples mas o filme é de uma beleza inacreditável. Primeiro, apesar de ser 1924 e as câmeras de filmar ainda serem bastante grandes e incômodas, Murnau dá leveza à elas, fazendo-as andar pelos cenários, descer de elevador, atravessar vidraças e portas giratórias. É impressionante sua técnica, não deixando nada a dever aos filmes modernos que, muito claramente, beberam dessa fonte maravilhosa.

Segundo, esse filme mudo é o único filme de longa metragem verdadeiramente mudo. Não há nenhum uso de inter títulos com legendas explicando o que está acontecendo (há uma solitária exceção que tratarei mais a frente). Tudo acontece, tudo é contado, tudo é exposto apenas e tão somente com imagens. É uma aula de cinema como raramente se vê hoje em dia em que cada cena tem que ter duas narrativas de fundo, flashbacks, remontagens e muita pirotecnia para que todos entendam cada detalhe do que está ocorrendo. Em Der Letzte Mann, a sutileza e a precisão das imagens é tudo.

Terceiro, Emil Jannings está inacreditável no papel do porteiro. Ele começa grandalhão, peito estufado, sorriso no rosto e vai, aos poucos, definhando até a figura patética sentada em um banquinho no banheiro dos fundos do hotel. Dá verdadeira tristeza ver a transformação. Muitas desgostam de filmes mudos não só pela ausência de falas mas, especialmente, pelo aspecto caricatural da atuação dos atores. E é verdade que isso ocorre mas a explicação é simples: pelos idos dos anos 20, as técnicas de filmagem ainda não eram perfeitas o suficiente para captar todos os detalhes de uma atuação, fazendo com que os atores fossem forçados a atuar de forma teatral. Também nessa linha, estamos falando de atores muitos deles oriundos do teatro, ainda com grande presença no cotidiano das pessoas e o "ranço" teatral se faz presente em muitos papéis. No caso do porteiro de Jannings, porém, essa atuação exagerada no começo faz parte da personalidade do personagem tanto que, ao ser necessária a suavização dos gestos e das expressões, Jannings consegue tirar de letra, mostrando que era um ator completo. Tem muito ator moderno que se diz verdadeiro ator que deveria assistir esse filme várias vezes por semanas a fio...

Sobre o único inter título, vale um aviso para quem quer ver esse filme ainda sem que eu estrague o prazer: COMENTAREI SPOILERS A SEGUIR.

Vocês foram avisados.

Murnau acaba seu filme verdadeiro com o espírito do porteiro completamente massacrado pelo acontecimentos do filme. Ele é uma sombra do que era e o filme deveria efetivamente acabar assim. Por pressão dos produtores, porém, Murnau foi obrigado a filmar um final feliz completa e absurdamente improvável e ele usa o inter título para explicar ao espectador a razão de ter feito isso. Lidas as legendas, vemos o porteiro milionário, após ganhar uma inesperada herança, comendo quilos de comida no restaurante do hotel, sob o olhar furioso de seu ex-chefe. É esse final que é referenciado nas traduções americana e brasileira do título original alemão.

Esse final estraga o filme? Certamente que não. Murnau explica tudo antes e torna o que acontece depois uma curiosidade apenas, algo que, tristemente, vem acontecendo mais e mais especialmente em filmes americanos: a introdução do deus ex machina para mudar completamente o final de filmes tristes e pesados.

Sobre o Club du Film:

Há pouco mais de quatro anos, no dia 28 de dezembro de 2005, eu e alguns amigos decidimos assistir, semanalmente, grandes clássicos do cinema mundial. Esse encontro ficou jocosamente conhecido como "Club du Film". Como guia, buscamos o livro The Great Movies do famoso crítico de cinema norte-americano Roger Ebert, editado em 2003. Começamos com Raging Bull e acabamos de assistir a todos os filmes listados no livro (uns 117 no total) no dia 18.12.2008. Em 29.12.2008, iniciamos a lista contida no livro The Great Movies II do mesmo autor, editado em 2006. São mais 102 filmes. Dessa vez, porém, tentarei fazer um post para cada filme que assistirmos, com meus comentários e notas de cada membro do grupo.

Notas:

Minha: 9,5 de 10
Barada: 7,5 de 10

domingo, 18 de abril de 2010

Crítica de TV: Prison Break - 4ª Temporada

Prison Break acabou e, na verdade, a série acabou vivendo mais do que deveria. Na primeira temporada, vemos Michael Scofield (Wentworth Miller) tentando libertar o irmão, Lincoln Burrows (Dominic Purcell), de uma prisão de segurança máxima, por um assassinato que ele aparentemente não cometeu. Michael é um geninho e seu plano para escapar da prisão com o irmão é para lá de complicado: ele tatua no corpo todo instruções de "como escapar" e finge assaltar um banco apenas para ser mandado para a mesma prisão do irmão. Lá, ele começa a articular a fuga e a temporada acaba com eles fugindo (não é spoiler pois o bacana é o como, não o final em si).

Na segunda temporada, nós vemos que os planos de Michael não se limitavam à fuga, mas sim, também, a tudo o que deveria acontecer depois da fuga. Mais planos complicados, mais problemas, mais reviravoltas.

Aí veio a terceira temporada, um tanto quanto forçada mas também interessante. Dessa vez, Michael é que foi parar em uma prisão panamenha e tem que usar sua massa cinzenta para escapar de lá. Seu irmão o ajuda do lado de fora.

Quando acabou essa temporada, imaginei que nenhuma temporada poderia amarrar as pontas soltas deixadas pela 3ª e acabei demorando bastante para ver a 4ª e última. Foi uma grata surpresa quando comecei a assistir e a gostar de cada um dos 22 episódios da temporada final.

No entanto, para gostar dela, há a necessidade de esquecermos as premissas básicas de Prison Break. Não é que não ocorram fugas na quarta temporada. Ao contrário: cada episódio é uma espécie de fuga. Michael, Lincoln e toda a gangue, agora, são recrutados por um oficial da Homeland Security, Don Self (Michael Rapaport), para derrubar a enigmática e poderosa The Company, entidade que estaria por trás de todas as mazelas sofridas pelos irmãos.

Michael tem que pensar rápido em cada episódio, criando planos mirabolantes a cada minuto para libertar reféns, entrar em cofres, furar túneis, impedir assassinatos, descobrir pistas e muito mais. Os produtores resolveram esquecer de vez a pouca verossimilhança da série e partir logo para o total e absoluto exagero, com 10 reviravoltas e 15 revelações chocantes por episódio.

Como disse, cada episódio é um Prison Break inteiro e isso dá uma dinâmica muito interessante, que torna perigoso o espectador piscar pois ele pode perder algum detalhe bacana. Mas também é uma fórmula cansativa e os roteiristas, pelo que parece, perceberam isso. Assim, lá pela metade da temporada, a dinâmica  muda completamente, com toda a caçada dos primeiros 10 ou 11 episódios dando lugar a uma nova caçada, também muito interessante e com mais reviravoltas ainda. Essa capacidade dos roteiristas de sacudirem a série, apesar de utilizarem, em linhas gerais, a mesma fórmula, impede que ela fique enfadonha.

O final, para aqueles que ainda não viram e têm receio de que não seja satisfatório, é bem redondo, com todas as pontas devidamente fechadas. Além disso, é um final definitivo, sem nada aberto para dar azo a mais  filmes ou séries. É bem verdade que há um filme lançado após o fim dessa temporada (The Final Break) mas ele não é exatamente uma continuação. Explicar mais é estragar a série. Em breve farei meus comentários sobre o filme.

Assim, por ter sido reinventada, Prison Break, em sua quarta temporada, consegue ser tão boa ou, arriscaria dizer, até melhor que a primeira, isso desde que o espectador esteja apto a aceitar as maiores barbaridades (no bom sentido) em termos de roteiro...

Nota: 9 de 10

Crítica de filme: Clash of the Titans (2010) (Fúria de Titãs 2010)


Sou um fã do Fúria de Titãs original. Adoro todos os personagens, especialmente a coruja metálica Bubo. O filme foi lançado em 1981 e dirigido pelo inexpressivo diretor Desmond Davis. No entanto, o filme tinha como estrelas os fantásticos Sir Laurence Olivier (Zeus), Claire Bloom (Hera), Maggie Smith (Thetis) e Ursula Andress (Aphrodite). Todos deviam, claro, estar precisando de uma graninha lá pelo começo da década de 80, caso contrário não teriam aceito papéis em filme decididamente B, com um roteiro tenebroso. Ainda por cima, todos eles são coadjuvantes em relação a Harry Hamlin, no papel de Perseus. Hamlin é um ator de uma nota só, completamente inexpressivo e quase uma caricatura de si próprio.

Mas o sensacional mesmo do original foi o trabalho em stop motion de Ray Harryhausen. Harryhausen, para quem não sabe, é o mestre dessa técnica e nos brindou com filmes como Simbad and the Eye of the Tiger, The Golden Voyage of Simbad, One Million Years B.C., Jason and the Argonauts e muitos, muitos outros. Sua técnica é impressionante e todo o filme em que ele trabalhou é, no mínimo, um prazeroso show visual.

No Fúria de Titãs original, Harryhausen animou não só a mencionada coruja metálica Bubo como, também, a Medusa, os escorpiões e o Kraken. São todos de tirar o fôlego ainda que, claro, pelos padrões hollywoodianos pasteurizados de hoje em dia, os mais jovens certamente acharão tudo uma porcaria. Não sabem o que estão perdendo.

Bom, como estava nos EUA no dia de estréia do novo Fúria de Titãs por lá (que só estréia dia 21 de maio por aqui), tratei de ir ao cinema, claro. Procurei assistir na melhor rede de cinemas existente, a Arclight Cinemas. Quem tiver a oportunidade de ver um filme nessa rede, especialmente no The Dome em Los Angeles, não vai querer outra coisa.

Mas eu divago. Tinha boas expectativas para o novo Fúria de Titãs pois gostei muito dos trailers e confio em Louis Leterrier, um diretor menor mas que fez bons filmes como Transporter 1 e 2, Danny the Dog e The Incredible Hulk. Nada assim sensacional mas, em linhas gerais, um bom currículo de ação. Obviamente que, apesar disso, estava com um pé atrás por se tratar de um remake de um de meus filmes favoritos (sim, favoritos). Fiz meus comentários sobre remakes aqui e já dá para sentir o que eu acho deles.

De toda forma, o que vi agradou a criança em mim e fez o adulto se arrepiar. A criança em mim se divertiu muito com a pancadaria interminável que é esse filme, com muitas espadas, lanças, flechas, monstros bacanas e mitologia grega misturada com mitologia nórdica (o Kraken, monstro principal do filme, é exclusivo da mitologia nórdica, erro tão absurdo que chega a ser engraçado, mas que vem desde o original de 1981).

A estória, para quem não sabe, nos mostra Perseus, semi-deus que é convocado a ajudar os humanos para destruir o monstro Kraken e salvar Andrômeda, passa por aventuras na Grécia contra figuras mitológicas. Não é muito mais do que isso.

Como disse, o adulto em mim sofreu bastante com o filme mas vamos começar pelo lado bom.

Primeiro, a estória da "origem" de Perseus é mais coerente nesse filme do que no original. Apesar de ela não ser contada de forma cronológica, a remontagem que podemos fazer na cabeça dá muito mais propósito à estória do que a mal ajambada desculpa do filme original.

Os efeitos especiais, apesar de não serem stop motion, claro, são muito bons e, de certa maneira, homenageiam Ray Harryhausen. Basta ver a eletrizante - e longa, muito longa - cena de batalha com os escorpiões gigantes. Eles são claramente fruto de computação gráfica mas uma computação gráfica que dá a impressão que são animatrônicos. Achei esse toque muito bacana e bem vindo.

Outra luta que impressiona é com a Medusa. Agora, o monstro é extremamente ágil e a cena é genuinamente cheia de suspense (dentro do que um filme de ação como esse permite, claro).

Infelizmente, o lado bom acabou aí.

O filme, apesar de nos apresentar uma estória um pouco mais coerente em relação ao Perseus, simplesmente não tem roteiro. Por que Zeus (Liam Neeson, um tanto quanto deslocado nesse filme, na mesma linha de Laurence Olivier no original) ajuda Perseus? Não me convenceu que o mero parentesco entre os dois seja suficiente para justificar as ações do deus supremo já que ele, basicamente, coloca o filho contra seus próprios interesses.

Depois, a motivação de Perseus é para lá de idiota. Ele tem que matar o Kraken não especificamente para salvar Andromeda (Alexa Davalos) - ainda que isso seja um efeito colateral - mas sim para poder se vingar de Hades (Ralph Fiennes), sem deixar claro exatamente como.

Além disso, Perseus deixa muito claro que é um pescador e nada mais, não tendo nem mesmo tocado em armas. No entanto, em questão de dias, Perseus se transforma em um guerreiro nato. A explicação que tentam dar é que ele é um semi-deus, como se o simples fato de ser semi-deus significa que a pessoa automaticamente é um guerreiro (Baco é um deus e não é um guerreiro, muito pelo contrário...). O treinamento dele com o guerreiro Draco (Madds Mikkelsen, o ótimo Le Chiffre de Casino Royale) é patético. Leva três minutos, sendo que Perseus consegue segurar os golpes do super tarimbado soldado já na primeira tentativa, desarmando-o (!!!) na segunda.

E como explicar Io? Trata-se de personagem importante que não existia no filme original. Talvez seja uma substituição à coruja Bubo que, aliás, aparece por alguns segundos no filme. Io é uma misteriosa mulher (Gemma Arterton) que diz acompanhar a vida de Perseus. Ela o guia e o ajuda em sua jornada mas os dois, de maneira muito estranha, começam a se aproximar romanticamente. É algo inesperado e completamente deslocado no filme. O final dela, então - não vou contar, fiquem tranquilos - é ridículo, de fazer rir.  É um genuíno momento "What the fuck?"...

Ralph Fiennes, coitado, faz o único deus que não se veste com brilhantes armaduras, mas sim com uma túnica preta bem surrada. Acho que a Warner quis economizar e aproveitou o figurino do ator na série Harry Potter pois, desde o primeiro momento em que ele aparece, não consegui deixar de pensar em Voldemort...

O ator principal, Sam Worthington (o cara está em todas, não?) é o perfeito equivalente a Harry Hamlin do original: um ator de ação sem nenhuma sutileza que só tem duas caras, zangado e mais zangado.

Mas o Oscar de personagem sub-aproveitado fica mesmo com Calibos (Neil McCarthy). No original, ele é, basicamente, o vilão principal. No remake, ainda que sua origem seja mais interessante pois está amarrada com a de Perseus, ele aparece em cena duas ou três vezes e, sinceramente, não é lá uma ameaça tão grande.

E o clímax com o aparecimento do Kraken? Bom, posso dizer que os efeitos especiais são sensacionais e o monstro muito bacana. No entanto, são uns 15 minutos para o monstro apenas se levantar da água. Sim, 15 minutos só disso. Ok, tem muita destruição nesse processo mas, mesmo assim, é tempo demais. Quando ele finalmente se levanta, o filme literalmente acaba. E esse era o monstro que derrotou os Titãs mencionados no começo do filme... Que porcaria, hein?

O novo Fúria de Titãs, sem dúvida alguma, apesar de seus enormes defeitos, diverte. Deixe seu cérebro na porta e assista-o esperando muito pouco. A maior vantagem dele é fazer com que aqueles que cresceram com o original façam uma "viagem no tempo" e, após sair do cinema, queiram ver Bubo novamente.


Nota: 5 de 10

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Club du Film - 5.39 - The Producers (1968) (Primavera para Hitler - 1968)

The Producers foi o sexto filme do 5º ano do Club du Film (mais sobre o Club ao final desse post). Assistimos ao filme no dia 09.02.10.

The Producers (1968) foi o primeiro filme dirigido pelo sensacional Mel Brooks que, depois, nos trouxe Blazing Saddles, Young Frankenstein, High Anxiety, History of the World: Part I, Spaceballs e várias outras pérolas da comédia escrachada, efetivamente criando um subgênero satírico que só pode ser caracterizado como "estilo Mel Brooks de comédia".

No entanto, meu primeiro contato com The Producers se deu de maneira inversa. O filme se tornou um musical da Broadway em 2001 e, alguns anos depois, sem ter visto o filme, assisti a peça em Los Angeles com Nathan Lane e Martin Short. Junto com Spamalot do grupo Monty Python, considero The Producers como as peças mais engraçadas que já vi na vida. Tive cãimbras estomacais ao assistir às duas.

Aí, claro, curioso que sou e admirador do tal "estilo Mel Brooks", tratei de ver o filme não muito tempo depois da peça de teatro e foi uma decepção. Sim, uma decepção. Talvez eu estivesse contagiado pela experiência teatral que tinha acabado de ter e o filme acabou abafado, quase sem graça. Sei que isso é certamente injusto com essa obra de Mel Brooks mas não posso fazer nada. Foi o que achei. E, para fins de comparação, a refilmagem de 2005 também não funcionou muito bem para mim. Acho que realmente fui contaminado pelo teatro.

Paciência.

No entanto, por favor, The Producers é considerado uma das grandes comédias de Brooks e de forma alguma quero que essa crítica diminua o interesse dos que ainda não viram o filme. Quem gostou do filme de 2005 certamente gostará desse de 1968.

A estória! Já ia me esquecendo dela que, diga-se de passagem, é sensacional. Max Bialystock (Zero Mostel) é um produtor teatral da Broadway que já viu dias de glórias mas que, agora, não acerta uma. Quando o contador certinho Leo Bloom (Gene Wilder), descobre que seria possível enriquecer com a contabilidade de uma peça que fosse um fracasso certo, os olhos de Max brilham e os dois partem para caçar um roteiro que, sem dúvida alguma, será um fracasso. Acabam achando o roteiro de uma peça intitulada Primavera para Hitler, escrita por um ex-soldado nazista que ainda é nazista e adora Hitler mas que hoje cuida de pombos. A peça é uma ode ao maníaco líder nazista e, obviamente, não poderia gerar uma peça de sucesso. Seria um ultraje total, certo?

Max, então, parte para arrumar dinheiro para bancar a peça e começa a mexer em sua agenda para tirar dinheiro de todas as senhoras idosas que consegue enfeitiçar com seu charme. Com tudo pronto, a peça é lançada e, como não poderia deixar de ser, é um SUCESSO estrondoso. É o fim da carreira de Max e Leo?

A estória, por si só, vale ver as duas versões do filme e assitir à peça de teatro pois Mel Brooks consegue ser preciso em suas doses de sarcasmo, comédia rasgada e crítica social. Apesar de algumas atuações histriônicas, talvez ditadas pelo roteiro, a estória é 100%. O que não gostei no filme não conta de verdade pois foi uma visão afetada pelo quanto eu gostei da peça de teatro. De toda forma, achei que Zero Mostel não está bem no papel de Max e Gene Wilder está exagerado e teatral demais para ser Leo Bloom.


Sobre o Club du Film:

Há pouco mais de quatro anos, no dia 28 de dezembro de 2005, eu e alguns amigos decidimos assistir, semanalmente, grandes clássicos do cinema mundial. Esse encontro ficou jocosamente conhecido como "Club du Film". Como guia, buscamos o livro The Great Movies do famoso crítico de cinema norte-americano Roger Ebert, editado em 2003. Começamos com Raging Bull e acabamos de assistir a todos os filmes listados no livro (uns 117 no total) no dia 18.12.2008. Em 29.12.2008, iniciamos a lista contida no livro The Great Movies II do mesmo autor, editado em 2006. São mais 102 filmes. Dessa vez, porém, tentarei fazer um post para cada filme que assistirmos, com meus comentários e notas de cada membro do grupo.


Notas:

Minha: 7 de 10
Barada: 8,5 de 10
Gort: 8,5 de 10

domingo, 11 de abril de 2010

Club du Film 5.38 - My Dinner with Andre (Meu Jantar com André)

O Club du Film (mais sobre ele ao final desse post) completou 4 anos de existência no dia 29.12.2009, quando assistimos Rouge (A Fraternidade é Vermelha), o terceiro filme da Trilogia das Cores do diretor polonês Krzysztof Kieslowski.  Rouge foi, na verdade, o primeiro filme do 5º ano. Mas consideramos toda a trilogia como uma sessão apenas, para não fazer muita confusão na contagem de filmes. Assim, My Dinner with Andre foi o quinto filme do 5º ano e o terceiro do ano de 2010, pois o assistimos no dia 02.02.10.

My Dinner with Andre foi dirigido pelo diretor francês Louis Malle e lançado em 1981. O filme é simples e ao mesmo tempo difícil de explicar. A premissa é simples e, em tese, não poderia nunca funcionar em um longa metragem. São 110 minutos apenas de diálogo entre dois amigos que não se viam há algum tempo, durante um jantar. Não há flasbacks, cenas fora do restaurante ou qualquer outro mecanismo para ilustrar a conversa entre os dois. É, literalmente, com exceção dos primeiros 5 minutos, um diálogo, uma troca de idéias entre duas pessoas. Ainda por cima, quase que todo o tempo, há um close em cada um dos atores em que não vemos a reação do outro.

Aí vem a parte complicada, que é exatamente justificar o quão maravilhoso esse filme é. Para dizer a verdade, ao ler sobre a premissa, fiquei extremamente desanimado, achando que o filme seria arrastado e sonolento. Bom, sem exagerar, posso dizer que fiquei muito acordado, mais ou menos como se estivesse vendo um daqueles filmes de suspense sensacionais em que cada piscadela pode nos fazer perder pérolas da trama. Não que o diálogo seja de suspense, nada disso. O diálogo é um entrave existencial entre a praticidade de Wallace Shawn e a utopia de Andre Gregory. Os dois, como disse, são velhos amigos mas que não se vêem há tempos. Wallace é um escritor teatral frustrado e, quando eles nos é apresentado, teme o iminente jantar com Andre por Andre ser um homem mais experiente em termos de viagens e experiências de vida diferentes mesmo, além de ser um bem sucedido diretor teatral. Wallace e Andre, vale deixar claro, atuam nos papéis deles mesmos e, mesmo assim, conseguem ter as atuações de suas vidas.

Wallace Shawn é, sem dúvida, o mais conhecido ator entre os dois, tendo participado de várias séries de televisão e dublado vários personagens em desenhos animados. Basta pesquisar no Google que imediatamente reconheceremos seu rosto. Wallace faz, em My Dinner with Andre, o papel que todos nós esperamos que faça: o de autor desiludido, fracassado, que só sabe reclamar da vida. Wallace é o estereótipo desse papel mas, mesmo assim, o faz de forma inacreditavelmente brilhante.

Andre Gregory, para mim, era um ilustre desconhecido até eu ver esse filme. E, de fato, em termos de filmografia, My Dinner with Andre é seu único crédito e que crédito. Tenho para mim que são as palavras que saem da boca de Andre que fazem esse filme funcionar de forma brilhante. Ele reconta suas experiências teatrais alternativas na Europa e toda sua perspectiva de vida de forma tão vívida, tão palpável que parece que vemos as imagens do que ele estar falando pular para fora da tela como se fosse um desenho animado em que aquelas nuvens de pensamento surgem acima da cabeça dos personagens. É complicado expressar a perfeição do que acontece mas acho a metáfora do desenho animado é a mais precisa. Andre torna tudo que fala - por mais surreal que seja - algo fácil de aceitarmos e de criarmos uma imagem em nossa mente. É como ler um livro e imaginar os detalhes do que está escrito como se fosse um filme em nossa cabeça. Não pensei que isso fosse possível em um filme mas Louis Malle e Andre Gregory conseguiram me deixar de queixo caído.

Em determinado momento, Wallace que tem como objetivo de vida apenas pagar suas contas, ficar com sua namorada, escrever suas peças e ler livros, passa a defender o método científico, arguindo que não faz sentido acreditar que qualquer coisa venha da sorte ou algo do gênero. Andre, de forma apaixonada, tenta derrubar a tese de Andre mas não derrubando o método científico mas sim defendendo que ele é inútil nos dias de hoje.

My Dinner with Andre é um drama eletrizante, inteligente e que nos faz questionar e discutir muitos dos pontos trazidos pelos dois amigos horas depois do filme acabar. Vejam esse filme pois ele derruba essa necessidade hollyoodiana imbecil de ilustrar ou narrar em detalhes tudo o que está na tela. My Dinner é uma obra verdadeiramente sensacional que já alcei ao panteão de meus filmes favoritos.


Sobre o Club du Film:

Há pouco mais de quatro anos, no dia 28 de dezembro de 2005, eu e alguns amigos decidimos assistir, semanalmente, grandes clássicos do cinema mundial. Esse encontro ficou jocosamente conhecido como "Club du Film". Como guia, buscamos o livro The Great Movies do famoso crítico de cinema norte-americano Roger Ebert, editado em 2003. Começamos com Raging Bull e acabamos de assistir a todos os filmes listados no livro (uns 117 no total) no dia 18.12.2008. Em 29.12.2008, iniciamos a lista contida no livro The Great Movies II do mesmo autor, editado em 2006. São mais 102 filmes. Dessa vez, porém, tentarei fazer um post para cada filme que assistirmos, com meus comentários e notas de cada membro do grupo.

Nota:

Minha: 10 de 10
Barada: 9,5 de 10
Nikto: 8,5 de 10
Gort: 9,5 de 10

Club du Film - 5.37 - Ugetsu Monogatari (Contos da Lua Vaga)

O Club du Film (mais sobre ele ao final desse post) completou 4 anos de existência no dia 29.12.2009, quando assistimos Rouge (A Fraternidade é Vermelha), o terceiro filme da Trilogia das Cores do diretor polonês Krzysztof Kieslowski.  Rouge foi, na verdade, o primeiro filme do 5º ano. Mas consideramos toda a trilogia como uma sessão apenas, para não fazer muita confusão na contagem de filmes. Assim, Ugetsu Monogatari foi o quinto filme do 5º ano e o quarto do ano de 2010, pois o assistimos no dia 26.01.10.

Ugetsu é um sensacional filme japonês dirigido por Kenji Mizoguchi e lançado em 1953. Trata-se, de forma bem simplista, de uma estória de fantasmas. Mas, claro, chamar Ugetsu de um filme de fantasmas, não dá a dimensão do que ele é de verdade.

Trata-se da estória de Genjurô (Masayuki Mori), uma ceramista em pleno Japão feudal do século XVI. Nessa época, o Japão passava por um destruidor período de guerras civis e Genjurô descobre que pode fazer fortuna com seus potes de cerâmica. Seu vizinho Tobei (Eitarô Ozawa) não acredita muito nele e só pensa em ser um samurai e ir para a guerra. Tobei, no entanto, não tem dinheiro para comprar o material necessário e acaba se juntando a Genjurô na empreitada de cozinhar potes de cerâmica para vendê-los na cidade próxima. Suas respectivas esposas, Myiagi (Kinuyo Tanaka) e Ohama (Mitsuko Mito), no entanto, estão preocupadas com o vindouro ataque dos soldados ao seu vilarejo. Os quatro mal escapam e, no dia seguinte, voltam para recuperar seu potes e panelas e passam a vendê-los em uma cidade do outro lado do lago. Ao atravessarem o lago - em belíssima tomada, aliás - eles se depararam com os horrores da guerra e isso fica como um aviso para o futuro deles. Por causa disso, Genjurô deixa seu filho e esposa às margens do lago e promete voltar em alguns dias.

Ao chegarem na cidade e fazerem algum dinheiro, separações ocorrem: Tobei compra sua roupa de samurai e, apesar dos apelos da esposa, se junta ao exército; Genjurô, por sua vez, vai entregar seus produtos em uma mansão ocupada por Lady Wakasa, uma estranha dama da aristocracia japonesa.

Tobei faz de tudo para crescer rapidamente entre os soldados e mente caminho acima, até se tornar um "reconhecido" samurai. Genjurô é enfeitiçado por Lady Wakasa, que o quer como marido. Lady Wakasa é o tal fantasma da estória e Genjurô, totalmente subjugado, passa a se deliciar com os conforto oferecidos. Os dois homens, basicamente, esquecem suas vidas anteriores e passam a vive fantasias. Obviamente, as ambições dos dois acaba levando a consequências graves que o fazem acordar para a realidade.

O filme tem uma fotografia belíssima em preto-e-branco e tem imagens impressionantes, como a já citada travessia do lago e, também, a cena em que Tobei descobre o que aconteceu com sua mulher. O final é puro lirismo e é belíssimo, fazendo qualquer marmanjo disfarçar as lágrimas.

A reconstrução de época pareceu-me impressionante, com detalhes sobre o vilarejo, a guerra e o mercado da cidade onde Genjurô e Tobei vão vender seus produtos que dão a impressão não só de veracidade mas, também, de uma árdua pesquisa do Japão feudal. Nada parece fora de lugar e aceitamos tudo com muita naturalidade, inclusive a aproximação de Lady Wakasa e de sua serviçal. Nada indica o aspecto fantasmagórico do filme a não ser, talvez, a cena do lago que, como disse, funciona como um prenúncio do que veremos pela frente.

A estória de fantasmas japonesa não é, normalmente, estória de horror como no ocidente. Os fantasmas são usados mais como alegorias e alguns são bons, com objetivos benignos na estória. O filme é, principalmente, um descortinamento e um estudo sobre a ambição e o quanto ela pode cegar os homens. É, também, uma estória de redenção e expiação.

Sobre o Club du Film:

Há pouco mais de quatro anos, no dia 28 de dezembro de 2005, eu e alguns amigos decidimos assistir, semanalmente, grandes clássicos do cinema mundial. Esse encontro ficou jocosamente conhecido como "Club du Film". Como guia, buscamos o livro The Great Movies do famoso crítico de cinema norte-americano Roger Ebert, editado em 2003. Começamos com Raging Bull e acabamos de assistir a todos os filmes listados no livro (uns 117 no total) no dia 18.12.2008. Em 29.12.2008, iniciamos a lista contida no livro The Great Movies II do mesmo autor, editado em 2006. São mais 102 filmes. Dessa vez, porém, tentarei fazer um post para cada filme que assistirmos, com meus comentários e notas de cada membro do grupo.

Notas:

Minha: 9 de 10
Klaatu: 9 de 10
Barada: 9 de 10
Gort: 9 de 10

sábado, 10 de abril de 2010

Club du Film - 5.36 - Laura

O Club du Film (mais sobre ele ao final desse post) completou 4 anos de existência no dia 29.12.2009, quando assistimos Rouge (A Fraternidade é Vermelha), o terceiro filme da Trilogia das Cores do diretor polonês Krzysztof Kieslowski.  Rouge foi, na verdade, o primeiro filme do 5º ano. Mas consideramos toda a trilogia como uma sessão apenas, para não fazer muita confusão na contagem de filmes. Assim, Laura foi o quarto filme do 5º ano e o terceiro do ano de 2010, pois o assistimos no dia 18.01.10.

O filme, dirigido por Otto Preminger em 1944, é um autêntico noir em certos aspectos mas esse, diferentemente de muitos outros clássicos do gênero, tem uma espécie de nonsense embutido que chega a ser engraçado. Não dá para falar muito do filme sem estragar algumas reviravoltas e surpresas, pelo que, se você não o viu e tiver interesse em vê-lo - e eu recomendo - pare de ler meus comentários aqui.

Sua última chance de parar é agora. Eu avisei.

Ok, se estiver ainda aqui é por que já viu ou não se importa em saber de twists. A estória começa com a morte misteriosa de Laura (a bela Gene Tierney). Tamanho é o segredo e a estranheza que Preminger imprime ao filme que fica bastante óbvio, para quem está mais escolado com filmes dessa natureza, que essa morte talvez não seja morte mesmo. Não demora muito para o detetive encarregado do caso, Mark McPherson (Dana Andrews, extremamente caricato e canastrão), dar de cara com a vítima, vivinha da silva. Antes disso, porém, a primeira coisa "fora de lugar" acontece: Mark literalmente se apaixona pela imagem de Laura, antes de conhecê-la. Só falta ele entrar no quarto da vítima e roubar uma calcinha dela de tão estranha que é a coisa.

E não pára por aí, Laura tem (ou tinha) um protetor, um colunista bastante efeminado e irritante chamado Waldo Lydecker (Clifton Webb, cheio de trejeitos e excelente no papel). Ele conheceu Laura no começo de sua carreira, que acabou sendo impulsionada por ele depois que ela resolve abordá-lo em um restaurante (aliás, cena memorável, com tiradas brilhantes de Waldo). Como não poderia deixar de faltar em um filme noir, a narração é de Waldo que nos é apresentado lendo em sua banheira. Fica óbvio que esse maluco também é apaixonado por Laura.

E tem ainda Vincent Price (sim, ele, novinho, novinho mas já com cara de Dr. Phibes), um malandro aproveitador que, em tese, era o namorado de Laura à época de sua morte.

A trama rocambolesca não interessa muito, na verdade. As reviravoltas estão lá somente para divertir e impulsionar um filme que, de outra maneira, não seria nada interessante. Com diz Roger Ebert em sua crítica, a escolha do assassino é completamente aleatória, sem um crescendo que leve à essa conclusão. O interessante mesmo é ver coisas surreais como um dos suspeitos ter sua presença aceita no interrogatório do outro suspeito ou o detetive usar perigosamente estratégias bem do tipo Agatha Christie para fazer o assassino se revelar.

Chega a ser engraçado em diversos momentos mas, de alguma maneira que eu realmente não saberia explicar, o filme prende o espectador. Talvez tenha sido a capacidade de Preminger de extrair de Price e principalmente de Webb, atuações muito boas que roubam as cenas e, em última análise, o filme inteiro. Mark, o detetive, está lá apenas com a cola que dá algum sentido à trama mas o foco fica mesmo nos dois principais suspeitos, cada um agindo de maneira mais absurda que o outro e nós, no meio de tudo isso, não podemos deixar de sorrir e de nos divertir.


Sobre o Club du Film:

Há pouco mais de quatro anos, no dia 28 de dezembro de 2005, eu e alguns amigos decidimos assistir, semanalmente, grandes clássicos do cinema mundial. Esse encontro ficou jocosamente conhecido como "Club du Film". Como guia, buscamos o livro The Great Movies do famoso crítico de cinema norte-americano Roger Ebert, editado em 2003. Começamos com Raging Bull e acabamos de assistir a todos os filmes listados no livro (uns 117 no total) no dia 18.12.2008. Em 29.12.2008, iniciamos a lista contida no livro The Great Movies II do mesmo autor, editado em 2006. São mais 102 filmes. Dessa vez, porém, tentarei fazer um post para cada filme que assistirmos, com meus comentários e notas de cada membro do grupo.

Notas: 

Minha: 7 de 10
Klaatu: 8 de 10
Barada: 8 de 10
Gort: 8,5 de 10

terça-feira, 6 de abril de 2010

Crítica de filme: Ninja Assassin (Ninja Assassino)

Em tese, qualquer coisa com Ninja é bacana e acende aquela luzinha nerd em todos nós. No entanto, apesar de ser um conceito fácil, afinal um cara vestido de preto (ou branco, dependendo do caso), portando armas brancas super maneiras e desferindo golpes com precisão e velocidade deveria tornar um filme sobre ninjas muito fácil de ser feito, a grande verdade é que, friamente, não há nenhum filme dessa categoria que alcance o grau de "bom" ou mesmo "razoavelmente bom". Não estou falando de filme de artes marciais em geral pois, nessa categoria ampla, há vários muito bons, vindo à cabeça, imediatamente, Enter the Dragon, com Bruce Lee.

Ninja Assassin não muda em nada a sina dos filmes de ninja. É uma mal ajambrada estória de artes marciais em que o personagem principal, Raizo (Rain de Speed Racer), um ninja treinado por um clã que treina assassinos (obviamente), resolve trair seu treinador e proteger as vítimas do clã, de forma a se vingar de seu antigo mestre. Mesmo essa estória idiota é mal contada, não que eu queira uma estória inteligente de um filme de ninjas. No entanto, não precisava ser algo completamente simplista e previsível. James McTeigue, o diretor (fez V for Vendetta, que gostei), até que tenta dar ares de coisa mais inteligente mas falha absurdamente ao subestimar a inteligência do espectador, tentando enganar todo mundo ao dar a entender que Raizo é um dos bandidos.

Fora isso, o filme é uma desculpa de longos 99 minutos para se cortar cabeças, membros e torsos. Desde o primeiro segundo, o filme é uma sucessão disso, dos mais diversos ângulos e com as as mais diversas armas de corte. É bacana? Sim,certamente. Mas a repetição ad nauseam das mesmas cenas, muitas delas no escuro (já que os ninjas agem na sombra, como todos nós nerds sabemos mas que o filme faz questão de repetir umas 100 vezes) em que não entendemos exatamente o que está acontecendo chega a irritar.

Como se tudo isso não bastasse, a cereja no bolo são os poderes sobrenaturais dos ninjas. Particularmente, todos os filmes que mostram que ninjas são superpoderosos são automaticamente ruins. Para que isso? Quer dizer, então, que os ninjas têm o mesmo poder de Wolverine de se curar de qualquer ferida rapidamente? Podem correr que nem o Flash? São completamente invisíveis? Mesmo que eu fosse aceitar essas besteiras, é impossível conceber, então, que Raizo consegue derrubar dúzias e dúzias de seus pares ninjas apenas com alguns poucos golpes de katana e de outras armas. Os ninjas inimigos caem que nem maças podres. Raizo apanha, apanha, apanha, é cortado em pedacinhos e torturado e, mesmo assim, continua de pé, ágil como sempre. Ok, entendo que ele era o "melhor" do clã mas daí a haver esse abismo entre ele e seus pares é completamente ridículo, tão ridículo que impede que consigamos aceitar o filme. Fica parecendo uma coisa cartunesca, grotesca, sem nenhum propósito a não ser mostrar 1001 maneiras de ser cortar braços e pernas...

E fica pior: a luta final entre Raizo e seu mestre (por favor, não é spoiler, qualquer criança de 2 anos sabe que seria esse o final do filme) é a única luta que cria alguma dificuldade para Raizo e é lá que vemos o tal poder de super velocidade. Patético. E é mais patético ainda Raizo ter esse poder também mas só usar no final, exatamente nessa luta. Por quê? Alguma espécie de "código ninja" que só permite usar super velocidade em lutas mortais contra seu próprio mestre? Ou é mais uma falha tenebrosa de roteiro?

E, quando vocês achavam que não tinha como ficar pior, ainda tem uma estória sobre "corações especiais" que, devo confessar, morri de rir quando vi que os personagens não estavam brincando nem falando em metáforas. Não vou contar aqui mas é uma das coisas mais imbecis que vi em um filme, talvez só perdendo para o imbatível Battlefield Earth.

E olha que Rain é uma oportunidade desperdiçada. Basicamente é a única coisa boa do filme. Parece a reencarnação de Bruce Lee em termos de fator cool. A coreografia das poucas lutas que conseguimos ver também é muito boa e, devo confessar, me diverti com alguns aparos de escalpo... Essas três razões é que não me permitem dar zero ao filme...

Nota: 3 de 10

Crítica de filme: How to Train Your Dragon (Como Treinar Seu Dragão)


A Dreamworks é um dos poucos estúdios que efetivamente mergulharam de cabeça nos desenhos de computação gráfica depois do embalo inicial da Pixar. A Disney tentou algumas vezes, para resultados meio cambaleantes, vide Chicken Little e Bolt e a Sony basicamente fez o péssimo Tá Chovendo Hamburguer. A Fox se deu bem na bilheteria com sua trilogia A Era do Gelo, apesar de, a cada filme, a qualidade ter caído, culminando com o fraquíssimo Era do Gelo 3.

A Dreamworks, por sua vez, começou muito bem, com o excelente Shrek. O filme, ganhador do Oscar de melhor filme animado de 2002, batendo o excelente Monsters, Inc. da Pixar (se foi justo eu não sei pois os dois filmes talvez sejam igualmente bons). Shrek tinha uma qualidade toda especial que era derrubar com todas as convenções do gênero "desenho animado". O herói era um monstro bem feio que só pensa em si próprio, odeia amizades e somente por interesse próprio resolve salvar a princesa que, no final, se revela também um ogro. Além disso, suas gags visuais e piadas diretas em relação à Disney eram impagáveis. No entanto, a Dreamworks, vendo cifrões à sua frente, fez duas continuações péssimas (sim, as partes 2 e 3 são um lixo) e está vindo a quarta parte que, tenho para mim, será igualmente ruim. Também vendo cifrões, a Dreamworks partiu para Madagascar 1 e 2 que são filmes que sobrevivem apenas com a mesma piada o tempo todo. Depois vieram besteiras como Bee Movie, Flushed Away, Over the Hedge e Shark Tale (não nessa ordem) que são filmes completamente esquecíveis.

Kung-Fu Panda, porém, me deu esperanças. Apesar de não ser super especial, o filme é muito bem feito e tem piadas ótimas. Talvez o ponto alto da empresa, igualando o feito de Shrek (o primeiro, claro) em termos de qualidade e quebra de paradigmas, seja mesmo, porém, Como Treinar Seu Dragão.

O desenho conta a estória de Soluço, um filho de um chefe viking de uma aldeia localizada em um ilha no meio de nada com coisa nenhuma. O garoto é fracote e desajeitado, só desapontando o pai, um grande matador de dragões, praga que assola sua aldeia. Em determinado momento, Soluço consegue acertar um dragão misterioso que ninguém tinha visto antes e, muito secretamente, passa a ser seu amigo. Essa descrição, tenho certeza, não faz jus ao que é o filme. Além da animação excelente, que não deixa nada a desejar à qualidade da Pixar (pronto, eu disse...), o roteiro representa, como já disse, uma quebra de paradigmas.

Não vemos a estória de um garoto crescendo à sombra do pai para se tornar, depois um homem à imagem do pai. Vemos um menino que, como todos, quer mesmo ser como o pai um dia mas que tem sua própria e peculiar personalidade. Aos poucos, vai vendo que a maneira do pai - e de seus conterrâneos - agir, talvez não seja a mais correta. No lugar de se curvar aos adultos, ele acaba impondo sua vontade e o final é longe de ser água com açucar. Sim, é um filme de superação mas não superação sem consequências. Nesses aspectos, ele lembra um pouco Shrek mas consegue ser bem mais sutil que o filme do ogro verde. Soluço e seu dragão demonstram que nem tudo que está estabelecido como verdade é verdade, por mais imutável que a situação pareça. Ponto para a Dreamworks.

Como também já disse, a animação é de primeiro nível. Os designs dos personagens, um pouco para o lado cartunesco, foi, também, a escolha certa. Foi como se os desenhistas resolvessem ressaltar - e exagerar - as qualidades e defeitos de cada um dos personagens. Mas o bacana mesmo são os dragões. Não vemos nada convencional. Há várias espécies, cada uma bem característica e cada uma desenhada de maneira extremamente original. O próprio dragão que se torna amigo de Soluço, Banguela, é um exemplo disso: todo mundo esperaria um lagarto verde enorme, com dentes afiados e língua bipartida. Soluço, muito ao contrário, parece ter pele sedosa (apesar de cheia de escamas quase invisíveis) e preta, além de ser, claro, banguela, pelo menos na maior parte do tempo. Além disso, age como um cachorrinho. Os outros dragões são igualmente originais, valendo destaque para os gordinhos, que são muito engraçados.

Enfim um desenho para competir com a qualidade da Pixar. Não estou dizendo que a Dreamworks chegou lá mas, se continuar por esse caminho, vai acabar chegando, ainda que eu sinceramente duvide que esse caminho seja efetivamente trilhado...

E o 3D, vocês vão me perguntar. Bom, para dizer a verdade, já enchi a paciência de filmes 3D mas minha filha escolheu ver "com óculos" e acho que foi uma boa escolha. As cenas de vôo em 3D são de tirar o fôlego e merecem ser vistas dessa maneira.

Nota: 9,5 de 10